sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Crônica Sobrevivente

Sobrevivente

“Acabei com tudo
Escapei com vida
Tive as roupas e os sonhos
Rasgados na minha saída...
Mas saí ferido
Sufocando meu gemido
Fui o alvo perfeito
Muitas vezes
No peito atingido...
Animal arisco
Domesticado esquece o risco
Me deixei enganar
E até me levar por você...
Eu sei!
Quanta tristeza eu tive
Mas mesmo assim se vive
Morrendo aos poucos por amor
Eu sei!
O coração perdoa
Mas não esquece à toa
E eu não me esqueci...”

(Trecho : FERA FERIDA - Composição: Roberto Carlos)
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Tenho ido a uma ou outra reunião social por conta das festividades de fim de ano e muitas vezes algumas pessoas, ao se referir a mim, dizem:

 “Esta menina é um exemplo de superação para todos nós.”

Sempre fico um tanto constrangida ao ouvir esta afirmação.
Não sou um exemplo de superação, sou meramente uma sobrevivente,
Como são sobreviventes todos os que enfrentam o trânsito e escapam de encontrar alguém embriagado ou fazendo uma ultrapassagem em local proibido,
Como são sobreviventes todos os que trabalham de sol a sol para produzir no campo o alimento que todos nós consumimos e encontramos fresquinho nas feiras e mercados.
Sobrevivente como os professores que vão para as salas de aula instruir alunos que estão envolvidos com drogas, violência e outros problemas sociais de toda natureza.
Sobrevivente como as crianças que crescem se alimentando mal por falta de recurso de suas famílias para comprar alimentos nutritivos e saudáveis para que elas cresçam com saúde e se desenvolvam totalmente apesar das doenças, da falta de assistência médica adequada.
Sobrevivente como um jovem negro, filho de pais analfabetos que só estudou em escolas públicas e ainda assim entrou em uma Universidade federal e se formou com louvor na profissão que sempre sonhou ter.

Se tive êxito após o meu acidente, e sobrevivi, e consegui superar algumas dificuldades iniciais como a cadeira de rodas, meu mérito é muito pouco em relação ao trabalho realizado pela minha família e os profissionais de saúde que cuidaram de mim. Eles é que são os merecedores de todo crédito.
E, é claro, a força maior que veio de alguém muito Maior e mais importante do que todos nós, sim falo do Criador, o pai amoroso que me concedeu a graça de ter comigo esta família e estes profissionais trabalhando comigo, por mim e para mim.
Não teria conseguido nada sem esta força, porque sem ela não haveria a família que me foi dada, nem os profissionais de saúde certos no lugar e hora certos para me ajudar.
Talvez o meu pequeno mérito seja apenas o de acreditar que podia acontecer que podia dar certo, que eu não devia desistir de jeito nenhum de tentar melhorar.
Que ficar me lamentando ou parar de buscar soluções seria pior.
Ou talvez, o meu mérito seja de achar que eu não tenho idade para desistir, que na minha idade a vida só está começando agora, mesmo que seja de uma maneira menos fácil do que é para a maioria das mulheres da minha idade. Mas é esta a vida que eu tenho, e é assim que eu devo aproveitá-la, é claro que eu sonhava com muito mais, com dias melhores, com mais felicidade e menos dificuldade, mas como ganhei mais uns dias de vida. Posso começar um pouquinho mais tarde do que todo mundo.
Bom encerro por aqui, estou com as óbvias saudades de tudo e de todos, meu endereço mudou, mas não sou difícil de encontrar para quem quer me achar.
Apareçam, no telefone, nas redes sociais pela internet, na minha casa na Baixa Grande em Arapiraca ou na Unidade de Emergência.
Estarei sempre esperando por cada amigo que resolver aparecer.

Mônica Oliveira da Silva, a sobrevivente.


Não o exemplo do que quer que seja.