Este é um pouco mais antigo mas eu gosto muito deste texto, principalmente pela receptividade que ele obteve dos meus leitores.
Dor vicia.
A dor nesta terra Severina (licença a João Cabral de Melo Neto) é moeda que vale muito. Nesta nossa exaltação dos sofredores, discos vendem-se aos milhares, estórias tristes se repetem até a exaustão na televisão, nas novelas, nos jornais, nos programas de auditório em que se ganha a audiência em cima de algumas lágrimas de pai, mãe ou irmãos, melhor ainda se forem lágrimas de crianças.
E de onde vem essa nossa necessidade de martírio, de purgação? É da religião? Da escola? Da família? (me diga alguém que souber).
Dor vicia.
Mais do que qualquer droga, sofrer preenche vazios. Cantaria um expert em sofrimento chamado Renato Manfredini Jr., o Russo, um dia: Parece cocaína, mas é só tristeza...
De tempos em tempos a gente acorda e pensa: Hoje vou sofrer e simplesmente sofre. Quem não for assim então me olhe com seus olhos que nunca choraram.
E motivos para sofrer todo mundo acha fácil os seus: o leite que derramou, o bom dia que não veio, o silêncio do quarto, o remédio de pressão que acabou, a novela, a falta de inspiração para escrever...
Eu já conheci quem sofresse porque tirou oito em prova: Eu tinha certeza que ia ser 10.
Sofre-se por tudo e toda dor é legítima.
Nossa nação com todos os seus carnavais é uma terra de viciados em dor. Ambulatórios estariam ainda mais cheios se tivessem inventado um tratamento para a epidemia de dor.
Os nossos grandes artistas, o que seria deles sem este vício coletivo? O Roberto sem “Detalhes”, o Chico sem “Atrás da porta” e aquele exagero só pra provar que ainda sou tua. O Vinicius sem o “Soneto de separação”. O Legião sem “Vento no litoral”. O Machado sem o Bentinho remoendo eternamente uma suposta dor de corno em “Dom Casmurro”?
Isso para falar em grandes; se a gente descer um pouco no prestígio dos artistas vamos notar fácil que o povão ama o sofrimento do Amado Batista, as lamentações dos sertanejos [os cantores], o sofrimento da mocinha na novela mexicana.
Tentemos ser felizes só para ser diferentes. Mas tomemos cuidado com a abstinência da dor, saudades de sofrer.
Ser totalmente feliz é uma farsa. Desconfie dos felizes, eles provavelmente sofrem escondido, logo, são falsos. Fique longe deles.
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009
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